quinta-feira, 14 de março de 2013

Pastores e Políticos


A Câmara dos Deputados tem, na sua atual composição, 511 deputados. Representam trinta partidos, dos quais 23 têm pelo menos um deputado eleito. Nos nomes desses partidos, em nove (dos quais sete com representação na Câmara) há as palavras Social, Socialista ou Socialismo, oito se declaram trabalhistas ou dos trabalhadores e oito fazem referência à democracia.
A proliferação dos partidos é benvinda se os partidos são criados para representar pontos de vista divergentes em busca de apoio popular. Mas, os partidos não têm sido criados para propor ideias. Apenas para lançar candidatos a cargos públicos. As eleições têm tido o papel, não de determinar estratégias de governo, mas, de escolher quais pessoas constituem a elite dirigente do país. Salvo alguns partidos identificáveis pela sua história, ainda que as posições de todos ao longo do tempo variem muito, pode-se esperar de qualquer partido o apoio a qualquer proposição. Do mesmo modo, ninguém estranha nenhuma transferência de nenhum político de um partido para outro.
Assim, a vida pública no Brasil é regida pelo princípio de que os políticos não representam partidos e muito menos eleitores, representam-se a si mesmos. Mas, como precisam atrair votos dos cidadãos, associam-se às legendas partidárias que consideram mais atrativas, seja pelas suas ligações com o governo, seja por não abrigarem concorrentes em sua área de influência. Uma vez eleitos para o Congresso Nacional, para demonstrar o seu valor e justificar o apoio a sua candidatura nas futuras eleições, além de manifestar opiniões que possam colocá-los sob uma luz favorável de imprensa, os deputados procuram destacar-se pela apresentação de projetos de lei.
Com isto, é enorme o volume de projetos submetidos em cada legislatura.  Acrescentando-se às novas iniciativas as correções que se revelam urgentes a leis absurdas aprovadas no passado, é fácil de imaginar a complexidade do processo legislativo. Para transformar os projetos em leis, além da loteria do voto dos 511 no Plenário, há uma via através da aprovação por uma legião de comissões. O número de comissões permanentes é atualmente 21. O Presidente da Câmara, assim como o presidente de cada comissão, têm, então, o importantíssimo papel de escolher quais projetos são levados a decisão cada dia e dirigir a discussão e votação daqueles projetos submetidos aos deputados.
São bem escolhidos esses presidentes? A escolha em 2013 do Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias é ilustrativa. Na democracia, esta deveria ser a comissão de maior importância. Trata, em princípio, de zelar pelo respeito às cláusulas pétreas da Constituição do país que impedem os detentores do poder de impor sua vontade arbitrariamente. Na prática, infelizmente, tornou-se importante pelo poder de aprovar vantagens para grupos supostamente discriminados.
Para presidi-la, o partido com maior representação na comissão indicou um pastor do Evangelho da Prosperidade. Esta corrente religiosa, com crescente representação na política, baseia-se em uma interpretação no sentido contrário do ensinamento cristão: é dando que recebemos. Baseiam na interpretação mercantilista dessa frase um negócio em que entram com o nome de Deus. Nesse negócio, o fiel paga o dízimo à igreja para comprar a proteção divina. Quanto mais der, garantem que mais ganhará. Terá lucro certo ao dar ao pastor, de lambuja, o voto, que não lhe custa nada. Aqui há, de fato, um círculo vicioso: quanto menor valor o brasileiro dá ao voto, pior escolhe e, quanto pior escolhe, menos valor tem razão de dar a seu próximo voto.
Assim, foi eleito para presidir comissão de tal responsabilidade um estranho pastor que aparece em vídeo, disponibilizado na internet por alguém que presenciou sua atuação, exclamando: “Samuel de Souza doou o cartão, mas não doou a senha! Aí não vale! Depois vai pedir o milagre pra Deus e Deus não vai dar, e vai falar que Deus é ruim!”... E, mais adiante, a frase que resume a plataforma política de toda uma liderança: “Tem gente que diz: ‘pastor, pastor! 1.000 reais eu não aguento!’ Traga 500 reais! Você só não pode é perder a benção. Quem crê dá um jeito...”

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