domingo, 16 de novembro de 2014

Personalização, em três estágios

Karen Horney descobriu que o conflito interno entre duas estratégias que lidamos para lidar com o sentimento de abandono, a de nos fazermos de forte e a de nos fazermos de simpático. Tentamos evitar o conflito entre essas duas falsas imagens desprezando a parte de nós que luta ou a que ama. Ou fugimos para uma “torre de marfim” em que o conflito passa a ser entre a ilusão de perfeição e o que Brennan Manning chama de “o impostor que habita em mim”.
Com isso, Horney encontra três tipos de básicos de personalidade e de sofrimento. A boa nova de que Deus é bom traz de volta qualquer um desses tipos à realidade.
 Mas, note-se: não adianta nada saber que Deus é bom se é um Deus “deu corda” no mundo e saiu da História O Evangelho de Cristo revela um Deus Pai, presente neste mundo. E presente, não mais como Poder, mas, sim, como Amor. 
Nesse primeiro momento, a revelação da Boa Nova me capacita para destronar o impostor. Ele continua em mim, fingindo de forte ou de simpático, mas, como já não preciso ser perfeito, começo a ser capaz de lidar com ele.
Depois da revelação, vem a experiência do amor de Cristo. Para que essa experiência redimensione nossos conflitos internos é preciso seguir o Jesus que ensina ao pé do monte até o que se entrega no Getsêmani. É preciso acompanhá-lo na Via Sacra, amando-nos mesmo quando o crucificamos. Encontramos aí a sensação de ser amado realmente. O Deus de Amor já não está só na distante criação do mundo, mas, está vivo neste homem que morre na cruz.
A mudança se completa quando o exemplo de Jesus nos atrai a exercer o papel de Filho de Deus realizando a obra do Amor. Não há ninguém mais forte que o que exerce a liberdade de realizar a vontade do Criador, que é a de fazer o bem a toda criatura. Imbuído dessa vontade, para o cristão toda derrota pessoal perde importância. Nesse terceiro estágio, como Paulo, já não sou em que vivo, mas Cristo que vive em mim. Cristo que perdoa no Calvário e consola em Emaús. Cristo que quer despertar em cada um o amor para que cada um foi criado.

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Crimes e Castigos no Brasil

Uma pessoa de posses, condenada pela lei brasileira, fugiu para a Itália, de onde o Brasil solicitou sua extradição. Ontem, a Justiça Italiana julgou o caso. A extradição foi negada. O motivo desta negativa,segundo os advogados das partes, foram as condições desumanas a que estão submetidos os presos nas penitenciárias brasileiras. Ouvidos pela Imprensa, ministros do nosso Supremo Tribunal, divergiram na avaliação da decisão, mas, concordaram que o fundamento é real: presos no Brasil são submetidos a condições degradantes.
As péssimas condições dos nossos cárceres incluem a superlotação. Esta, por seu turno, é um aspecto sinistro de um sistema criminal que exige, também, o superdimensionamento das forças policiais, com a incorporação a seus quadros de pessoas desqualificadas. Da ineficiência da polícia resulta que os crimes graves não são apurados e registra-se no país um número cada vez maior de assassinatos, por exemplo.
O erro básico desse sistema é, evidentemente, a opção política pelo emprego da repressão no combate ao uso de drogas. A proteção do cidadão contra o vício emprega no Brasil, prioritariamente, a criminalização de condutas que, tornadas ilegais, tornam-se mais lucrativas. Com a falta de qualificação e a limitada oferta de empregos, os desempregados são envolvidos em atividades como a de apontador do jogo de bicho ou a de entregador de maconha. Condutas mais graves, como a organização das redes de tráfico e a proteção policial ao crime, raramente são punidos, mas, as pessoas que se envolvem no contato direto com os consumidores lotam as cadeias.
É urgente a substituição dos meios repressivos por meios educacionais na prevenção do vício. Por que não tratar a maconha como o fumo e o álcool? Com o comércio legal, o preço mais alto de algumas drogas ainda continuará estimulando a formação de sistemas de produção e distribuição ao arrepio da lei, mas, em volume muito menor.
O problema penal se agravará ainda mais nos próximos anos com a nova legislação brasileira contra o enriquecimento ilícito. Precisaremos de polícia e cadeia para os grandes criminosos de colarinho branco que começam a ser presos.  Essa mesma legislação poderá alcançar os grandes traficantes.
A reforma necessária é profunda, mas, simples. O Uruguai pode nos servir de exemplo.

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

A Divisão entre os Eleitores no Brasil

A presidente foi reeleita com vantagem maior nos estados mais pobres do Brasil e desvantagem nos mais riscos estados. Concluiu-se daí que ela era a candidata dos pobres e seu oponente, o dos ricos. Nada mais equivocado.
Os ricos são, naturalmente, mais conservadores que os pobres. E o único tema político diferenciando os candidatos no segundo turno desta eleição era a continuação no poder de uma equipe de governo pelo quarto mandato ou a sua substituição por outra. A oposição prometia manter e aperfeiçoar todos os programas sociais e econômicos do atual governo.
O PT e o PSDB são, historicamente, partidos de esquerda, como outros 30 no Brasil. Têm ambos dominante participação da elite universitária paulista. Há 12 anos, o PT substituiu o PSDB na presidência da república e, aliando-se no Congresso ao PMDB, deu continuidade a sua gestão e satisfez, tanto ou mais que seu predecessor, os interesses legítimos ou escusos do empresariado. Hoje não se pode encontrar qualquer oposição ideológica entre os dois.
Para entender a divisão é preciso ver que os partidos contam muito pouco nas nossas eleições. O PT é, de fato, o único partido cuja sigla tem adeptos, mas essa preferência afeta pouco mais de 10% do eleitorado.  Isto basta para decidir uma eleição presidencial, mas, não explica a divisão geográfica.
No Brasil, a elite conservadora tem amplo controle do processo eleitoral. Não se vota em partidos ou plataformas, a escolha é apenas entre pessoas. O sociólogo Fernando Henrique Cardoso, defendendo seu candidato em certo momento, explicou a clivagem como uma diferença entre informados e desinformados. Acredito, parcialmente, nessa explicação.
Na verdade, a origem da divisão está em que, nos estados ricos, é maior a proporção dos que têm tempo para assistir os debates na TV enquanto, por outro lado, nos estados pobres, é maior a proporção daqueles que, vítimas do analfabetismo funcional, só conseguem dar importância à presença física, o rosto, o gestual, a voz dos candidatos.
 O marketing da candidata à reeleição foi notável na produção de uma imagem visual de energia e sensibilidade que, junto com o fato de tal imagem ser vendida nacionalmente há quatro anos, foi, em alguns momentos, suficiente para lhe dar grande vantagem. A meu ver, o que inverteu essa situação nos estados de economia mais avançada foi sua dificuldade de concatenar frases e perceber nuances conceituais, que só aparece quando é forçada a improvisar respostas. Nos debates, ela repetiu as respostas que ensaiou com sua equipe, mas, se perdeu nas ligações e nos detalhes. Na campanha anterior, essa dificuldade foi atribuída à inexperiência. Desta vez deixou claro para quem prestou alguma atenção que, se a escolha era de um gerente de alto nível, ela era a pior qualificada.
 O engraçado é que, se ela e seu antecessor tivessem retribuído aos estados pobres o apoio nas eleições anteriores com apoio para o desenvolvimento que só lhes pode dar a elevação da qualidade do seu sistema educacional, não teria tido uma votação tão alta nesses estados e não teria sido reeleita.

sábado, 11 de outubro de 2014

Algumas Razões para Votar na Dilma


Se Dilma ganhar, terá de combater a corrupção que a nova lei só no seu governo começou a desvendar. A classe média irá à rua contra o Caixa 2 das campanhas e até a Grande Imprensa aceitará a reforma política. Já Aécio, eleito com o apoio dessa imprensa hábil em escamotear as falcatruas com que empresários espertalhões sempre roubaram os cofres federais, estaduais e municipais, estará à vontade para empurrar toda sujeira para baixo do tapete. 

Se Dilma ganhar, terá de mudar a política econômica distorcida pelo favorecimento a grupos econômicos, que quase terá tirado o PT do governo. Se Aécio ganhar, entrará isento de responsabilidade pelas dificuldades econômicas e ficará à vontade para realizar os conchavos e a demagogia que assegure a seu partido o apoio suficiente para a reeleição.

Se Dilma ganhar, saberá que ganhou pela habilidade do seu marketeiro em dirigir sua campanha, não pela sua incapacidade de desempenhar com um mínimo de credibilidade os papéis que ele lhe atribuiu. Já Aécio, se ganhar continuará convencido de que é mesmo o Super-Homem que o fizeram parecer e se julgará capaz de vencer sozinho desafios reais. Isto é importante, porque o presidente é apenas um elo em uma engrenagem e quanto mais se tem poder de decidir mais humilde se precisa ser.


Podem crer. O Brasil não tem condição de sair desta campanha eleitoral com nada melhor que Dilma!

sábado, 4 de outubro de 2014

Medo e Esperança

Li em crônica dO Globo que os políticos brasileiros oscilam entre agradar a Imprensa e a Universidade, movidas pelas ideias, e a maioria, movida pelo sentimento. Discordo. Em primeiro lugar, na Imprensa e na Universidade brasileiras, são pequena minoria aqueles capazes de desenvolver autonomamente um silogismo sequer. Isto vale para o Brasil e para todos os países do mundo, uns mais, outros menos. É a limitação intelectual das nossas elites, não o fato de que a massa dos eleitores pensa com o estômago, a causa do nosso atraso.
Além disso, medo e esperança, egoísmo e inteligência estão em cada um de nós, aquele sempre muito mais forte que esta. Todos têm muito a perder, mesmo os que vivem da bolsa-família. Se a estes chegar a notícia de que a chefe do governo foi capaz de, ao representar a nação na ONU, humilhar-nos com um discurso de campanha eleitoral, perderá entre eles mais votos que entre os que na Imprensa terão de buscar novos anunciantes se perderem a eleição.
Um acidente viabilizou nesta campanha eleitoral uma candidatura que propôs uma Nova Política. Propôs substituir os personalismos e partidarismos pelo confronto de ideias, substituir os compromissos ocultos por ouvir a sociedade, substituir a demagogia pelo respeito à vontade do povo.
Depois do espanto inicial, toda a Velha Política mobilizou-se ferrenhamente contra ela. Governo e Oposição encheram o programa eleitoral de intrigas: no confronto entre pastores e homossexuais, está mais do lado dos primeiros que nós; quer dar independência ao Banco Central para proteger os banqueiros, não a moeda; sua campanha tem uma caixa 2 como a nossa, fecha os olhos à corrupção tanto quanto qualquer político...
Eu imaginei, que, na Imprensa, essa escandalosa mobilização merecesse alguma condenação. Ao contrário, os analistas políticos vieram com novas críticas. Ao denunciar os motivos da campanha de que era vítima, a nova candidata estaria demonstrando sua fraqueza... Ao não usar  seu mínimo tempo de TV para esclarecer as dúvidas criadas, estaria demonstrando despreparo...
A Esperança às vezes vence o medo. Collor, esperança criada pela TV, venceu. Lula, esperança criada pelos militares, venceu. Mostraram depois que não traziam nada de novo. Um foi derrubado, outro absorvido pela corrupção.
Mas, desta vez, há boas razões para acreditar no novo. Eu acredito que Marina, a seringalista, vai zerar o desmatamento como promete a sua plataforma. Eu acredito que Marina, a pobre, vai ampliar o Bolsa-Família tanto quanto diz. Eu acredito que Marina a analfabeta que já fala como uma professora, vai ouvir.
Não temais!  Precisamos de uma reforma eleitoral, de uma reforma política. Marina foi senadora e ganhou o respeito dos bons políticos que promete aproveitar: Pedro Simon, Eduardo Suplicy... Com eles, mas, sobretudo com o que há de bom em cada um de nós, vai vencer a Velha Política. 

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Raízes da Demagogia


Não devo criticar o nosso sistema eleitoral. Ele é muito importante para o nosso setor de comunicações, que por sua vez é muito importante para o PIB, que, afinal, deve ser muito importante.
Mas, acho que, para que o povo participasse do poder, nas eleições proporcionais, deveria escolher entre as plataformas dos partidos. Os eleitores de cada partido só num segundo turno escolheriam os seus representantes para as vagas que a votação geral lhe destinasse.

Em vez disso, a gente escolhe candidatos a deputado sem nos preocuparmos em saber qual política de governo supostamente fortalecemos com nosso voto, apenas delegando poder de barganha aos mais simpáticos. E votamos como quem escolhe a Miss Brasil, pelas qualidades cênicas com que os marqueteiros fantasiam os candidatos.

O paradigma para a política sem compromisso com ideias é a Imprensa. Viceja a demagogia na campanha eleitoral porque, o tempo todo, a Imprensa esconde as ideias e explora as emoções. Os partidos não enfrentam os problemas porque a Imprensa a aprofundar a crítica das suas propostas prefere a neutralidade.  

Uma reforma democrática no Brasil deveria voltar-se para exigir o confronto de ideias nas eleições e também fora delas. Não tanto para facilitar a decisão de eleitores avessos a pensar, mas para obrigar as lideranças a esclarecer suas posições. Um segundo passo na reforma política podia ser dado, sem necessidade de lei nova, com os jornais escolhendo partidos para ocuparem espaço nas suas páginas de opinião, diretamente ou indicando colunistas que os representassem oficialmente.

terça-feira, 15 de abril de 2014

Sete Pecados

Por que o Flamengo não devolve ao Vasco o título conquistado na prorrogação com um gol do bandeirinha reincidente em atuações a seu favor?
Por que a Federação de Futebol do Rio de Janeiro não exclui de seus quadros todo bandeirinha que insista em favorecer seu time preferido?
Por que a Polícia não investiga o atleta que declara publicamente que acha ganhar roubado mais gostoso?
Por que os tribunais da CBF, em vez de buscar a justiça, são instrumentos da legitimação de expedientes escusos?
Por que a FIFA não inclui nas suas regras a revisão automática dos lances de gol com base na melhor tecnologia disponível?
Por que a Imprensa não entende que no longo prazo mais vale defender a honestidade que aumentar a receita explorando fraudes que agradam à massa ignara?
Por que tantos de nós, flamenguistas e vascaínas, jovens e velhas, governantes e governadas, permanecemos omissos diante disso tudo?  

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

A Justiça em Campo

Acabo de ler em um veículo da nossa Grande Imprensa artigo assinado por um auditor do Supremo Tribunal de Justiça Desportiva defendendo as decisões nesse órgão, “de quem, trabalhando voluntária e gratuitamente, nada mais tem feito do que fazer valer as regras específicas vigentes”. O ilustre auditor, conselheiro federal da Ordem dos Advogados do Brasil, profliga como uma “guerra irresponsável” as tentativas de combater na Justiça decisões do STJD.
Seu fundamento é que a Constituição Federal garantiu “que o Poder Judiciário, em matéria de disciplina e competições, somente pode apreciar as matérias depois de esgotadas as instâncias da Justiça Desportiva”. Estranho argumento, posto que um Supremo Tribunal de Justiça Desportiva tem de ser a última instância da Justiça Desportiva. Assim, é precisamente contra as suas decisões que esse preceito constitucional autorizaria a recorrer ao Poder Judiciário.
O voluntarioso causídico pretende esclarecer o leitor de que esse Supremo Tribunal “apenas e tão somente, na forma das competências que lhe são próprias, aplica as normas relativas à disciplina”. A mim, não convence. Para mim, um órgão com esse nome, não pode ter outra atribuição senão fazer Justiça.
Duas decisões do STJD, relativas à última rodada do Campeonato Brasileiro de 2013, são a causa de todo o desprestígio a que ele está sendo submetido. Na primeira, ele tirou quatro pontos da Portuguesa por incluir irregularmente um atleta em um jogo em que apenas cumpria tabela. Esta decisão decretou o rebaixamento, evidentemente injusto, desse clube.
Na segunda injustiça, que decretou o rebaixamento do Vasco, negou-se a anular um jogo em que, depois de interrupção por falta de segurança por tempo superior ao previsto nas regras, este clube acatou a ordem das autoridades para reiniciar o jogo e acabou derrotado. Baseias-se, neste caso, o STJD em que o árbitro tinha autoridade para reiniciar a partida a qualquer tempo.
Estas decisões tornaram-se o estopim para um questionamento das autoridades do futebol.
Em um ano de Copa do Mundo, os meios de comunicação têm importantes interesses econômicos no futebol. É compreensível que os editores adotem uma posição conservadora e se esforcem em dirigir a opinião pública para a preservação da ordem. Vale o que o árbitro decidiu. Vale o que o STJD decretou. Questionamentos não são bem-vindos.
Entretanto, se esses editores procurassem enxergar o verdadeiro interesse dos meios de comunicação perceberiam que coincide com o dos torcedores do futebol. E dariam apoio a sua guerra por justiça.
Cada vez mais se desconfia dos árbitros de futebol. Cada vez mais se desconfia dos bacharéis da Justiça Desportiva. Está na hora de a Grande Imprensa ficar do lado do povo e exigir, pelo menos, duas mudanças , a meu ver, suficientes para devolver a credibilidade ao futebol.
Quais são essas mudanças? Primeiro: o direito de os árbitros só tomarem certas decisões (basicamente as decisões sobre as posições de impedimento) depois de concluída a jogada e recorrendo a todo apoio da tecnologia de gravação de imagens disponível. Segundo: substituição, na Justiça Desportiva, dos advogados credenciados por relações de renda e parentesco que hoje a constituem por atletas profissionais que se tenham destacado pela disciplina e pelo respeito ao esporte.

Se conseguirmos isso no Brasil neste ano de Copa do Mundo, estou certo de que estaremos lançando as bases para um novo futebol, digno das diretrizes traçadas para o esporte na nossa Lei Magna.