quinta-feira, 21 de março de 2013

Justiça e Amor

Na função de presidente do Superior Tribunal de Justiça, o ministro Joaquim Barbosa, ao condenar um juiz acusado de favorecer certos advogados em alguns processos, verberou as "decisões graciosas, condescendentes, fora das regras, de muitos juízes, em conluios com advogados".
Parece-me um pronunciamento natural e oportuno. Mas, como ocorre cada vez que uma autoridade condena a corrupção na Justiça no Brasil, a reação foi imediata. Argumenta-se, nesses momentos, imediatamente, que os casos registrados são exceções e que o acusador produz generalizações indevidas movido apenas pelo desejo de aparecer na Imprensa. É uma resposta inteligente, embora não me convença.
Desta vez, entretanto, a manifestação do ministro suscitou, de profissionais da Justiça, respostas mais reveladoras. Deslocaram essas respostas a discussão do tema das decisões viciadas pela aproximação entre juízes e advogados para o das relações de amizade entre pessoas em distintas posições de poder. E aí não se limitaram a realçar a legitimidade das relações fraternas entre juízes e advogados, que ninguém pode inferir das declarações de Joaquim Barbosa que não deveriam existir.
Ao contrário, investiram representantes dos juízes federais e dos advogados do Brasil contra o direito da pessoa humana de ter amigos em qualquer lugar. Segundo o publicado nOGlobo, o presidente da Associação dos Juízes Federais manifestou-se nestes termos: “A Imprensa divulgou que o ministro tem uma namorada advogada. Como é que fica isso?” Relata a mesma fonte pronunciamento na mesma direção, agora do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, de que até amantes precisam ser punidas em casos de relações promíscuas entre juízes e advogados.
Pretendem com isso dizer que não há diferença entre o acusador e os acusados. Só que relações de amizade ou amor entre pessoas das duas classes não constituem promiscuidade!  O que não pode haver são decisões injustas motivadas pelo desejo de agradar os mais próximos. E principalmente pelo interesse financeiro, quando, como nos casos frequentemente divulgados pela imprensa, os advogados amigos são, na verdade, portadores de suborno pago aos juízes.
Não se pode impedir que marido e mulher se encontrem nas posições de juiz e advogado, professora e aluno, fiscal e empresário. O absurdo é confundir a existência dessas relações com as de favorecimento iníquo. Isto põe em destaque o princípio que rege a ocupação das funções públicas em nosso país, de que a amizade é que deve prevalecer e não a inteligência, o coração e não a cabeça, o interesse e não a justiça... 
Para as nossas elites, o juiz não pode ter namorada advogada porque, nesse caso, terá de se deixar influenciar por ela nas suas decisões. Quando o chefe de um poder da República defende o princípio contrário,  dizem que apenas quer aparecer.  Não admitem os poderosos no nosso país que quem quer que seja manifeste a aspiração de que as decisões das autoridades se orientem, não pelos seus afetos e interesses, mas pelo que é certo e o que é errado.
Para combater essa cultura, os instrumentos de proteção automática contra o favorecimento ainda precisam ser muito aperfeiçoados. É preciso esforço par ampliar o âmbito das seleções por concursos público. O sistema de distribuição aleatória para o julgamento de ações na Justiça deve ser estendido. E, tanto quanto possível, a aproximação entre juiz e advogados ao longo deve processo deve ser limitada às audiências públicas. Não há que buscar ver em tal limitação ofensa a ninguém, mas, sim, proteção para todos.

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