sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Lei Mais Seca


Foi notícia, há pouco tempo, que um dos gerentes da Lei Seca no Rio de Janeiro, dirigindo embriagado, atropelou um grupo de pessoas, matando uma delas. A imprensa também divulga frequentemente casos de policiais que sequestram suspeitos, cobrando pagamentos para libertá-los. Tem a ver. Atuar em uma Operação Lei Seca, obrigando a parar e tratando como criminoso o cidadão que nada mais faz que trafegar em seu carro, é treinar para sequestrador. Multar e prender quem não fez mal a ninguém é desenvolver um desrespeito pela pessoa humana que há de um dia acabar em um comportamento como o daquele gerente.
Este é um custo evidente, mas não contabilizado do excesso de leis repressivas: criar uma super-casta de agentes da repressão. A autoridade que lhes é outorgada é um custo incomparavelmente maior que o benefício de coibir os abusos que se deseja reprimir. A proliferação de leis que, para combater comportamentos de alguns, submetem todos os cidadãos ao arbítrio, significa a extensão da atribuição da autoridade do Estado a pessoas cada vez menos qualificadas.
Leis só devem ser votadas depois de se verificar se seus benefícios superem os seus custos. Os benefícios de diferentes punições associadas ao uso do bafômetro em diferentes países e diferentes épocas podem ser avaliados precisamente.  E comparados aos de melhorar o traçado, a sinalização e a manutenção das estradas. Já os elevados custos para a sociedade de dar poderes excessivos à polícia são ainda melhor conhecidos. Assim, para aprovar uma nova Lei Seca ampliando esses custos alguma demonstração de sua utilidade deveria ser apresentada.
Ao contrário, o Senado Federal aprovou no dia 18/12/2012, sem discussão, em menos de dois minutos, e a Presidente da República sancionou apenas dois dias depois, nova lei que permite substituir a prova do bafômetro por avaliação subjetiva da embriaguez. Com base nessa avaliação, o motorista é sujeito a pena de prisão, além de pagamento de multa cujo valor foi dobrado, passando para cerca de dois mil reais. 
O efeito da nova lei, segundo as estatísticas, comparando-se as festas de fim de ano com as do ano passado, foi o esperado: o número de multas e prisões mais que dobrou. E o número de mortes nas estradas? Simplesmente, aumentou, de 353 para 392.
Não há dúvida de que a aprovação de leis rigorosas tem um efeito educativo e que merece reprovação dirigir sob o efeito de bebida alcoólica. Mas é muito mais forte o efeito deseducativo implícito na atribuição a cada vez mais agentes do poder para punir por novos crimes, enquanto crimes de extorsão e agressão praticados por autoridades públicas permanecem impunes. Contribui para o caos moral que fundamenta os desvios de percepção do certo e do errado que conduzem a esses comportamentos.
A Operação Lei Seca, uma violência contra o direito de ir e vir, aborda sua vítimas no meio da noite. Ébrios pelo prazer de se mostrarem superiores, seus agentes criam armadilhas para induzir sua vítima a cometer novas infrações. Escorre prazer de suas palavras como das fauces do leão que segura a presa. Impressionou-me o tratamento que presenciei de um comerciante que, embora sóbrio, era ameaçado de ter o veículo apreendido. Atrasara a vistoria por não ter dinheiro para pagar multas por estacionamento irregular do veículo usado em entregas. Alegava que, com o veículo apreendido, perdia seu único recurso de sobrevivência. O agente retrucava que os pneus também não estavam em bom estado.
Ainda não fui multado pela Lei Seca. E corro cada vez menos risco, não só por não ingerir os fatídicos miligramas de álcool, mas também porque estou evitando sair de casa para não ser pego pelos radares de velocidade. Mas, já tive parentes e amigos vitimados por ela. E não vem ao caso. Tapar os olhos para não enxergar não desculpa conviver com essa ignomínia. A culpa pela injustiça da lei não é só de quem a propõe e de quem a aprova no Congresso. É também da Imprensa que a trata como mais uma das novidades simples e fáceis de entender de que está sempre em busca. É também de quem gosta dela porque vê nela apenas uma forma de incomodar a minoria que anda de carro. E é também de quem se submete a ela por se julgar fraco demais para combatê-la.


Em O Cristão no Mundo - em www.toursoul.blogspot.com - digo mais sobre o que julgo ser nosso dever.

Um comentário:

  1. Caro Annibal. Parabéns pelo blog e por nos fazer pensar num assunto tão importante.
    Concordo que há abusos por parte de maus policiais. Porém, somos campeões mundiais de mortes por acidentes de trânsito, cerca de 50 mil por ano, muitas associadas à ingestão de álcool. Para mim, o papel da sociedade é exigir 5 coisas: educar o povo; melhorar as condições técnicas das vias; aumentar a fiscalização; acabar com a impunibilicade e aumentar as penalidades.
    Abraços
    Alberto

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