A
resistência dos Conselhos de Medicina ao emprego de médicos formados no
exterior tem pelo menos duas faces a serem examinadas com cuidado. Primeiro, há
a exigência de que esses médicos sejam submetidos ao Revalida, o exame nacional
recentemente criado para avaliar a qualificação de médicos formados em universidades estrangeiras que desejem exercer a profissão no Brasil. Mas, um segundo aspecto está
se tornando mais importante à medida que são reveladas as urgentes carências
das localidades a que esses médicos estão sendo destinados.
O Revalida
é um grande progresso e precisa ser prestigiado. É um exame nacional, com
componentes teóricos e práticos, que substitui um sistema de revalidação de diplomas
estrangeiros complicado e burocrático. Impõe-se prestigiar o Revalida.
Os
criadores, no Governo, do Programa Mais Médicos argumentam, para adiar a submissão ao
Revalida, que há necessidade de atender emergencialmente populações em situação
de abandono. Os médicos sem a aprovação no Revalida estão sendo contratados por um prazo
limitado para atender solicitações de municípios com vagas em serviços de saúde não preenchidas pelos médicos brasileiros. É incontestável que as
circunstâncias exigem a redução temporária das exigências de qualificação dos
médicos.
A
intransigência dos conselhos de classe dos médicos revela uma terrível falha na
formação dos profissionais que credenciam. Argumentar-se-á que entidades de
classe e corporações de ofício têm a obrigação de defender o mercado de
trabalho dos profissionais que abrigam. Mas, têm também outras obrigações. As
pessoas que as dirigem, ao colocar o interesse econômico da classe acima do bem
maior do atendimento aos necessitados, revelam não apenas incompetência para
geri-las. Revelam que falta humanidade a médicos escolhidos por médicos para
representá-los.
A
exigência até hoje de credenciamento para o exercício da profissão por corporações de
ofícios, seja de médicos, seja de economistas, jornalistas ou pessoas com
qualquer outra profissão é um absurdo. É verdade que a qualidade do ensino de muitas
instituições ainda não merece confiança, diplomas universitários podem ser fraudados
e, com o tempo, a formação de alguns profissionais caduca. Para lidar com
isso, exija-se, periodicamente, a validação dos diplomas. Mas, essa validação,
por um concurso nacional como o Revalida, é muito diferente da emissão de
credenciais por uma Ordem de Advogados ou um Conselho de Engenheiros.
Depois
da criação da Internet, nada impede que os governos administrem sítios com
informação objetiva sobre a qualidade de qualquer profissional de qualquer
área. Com essa informação disponível, é possível que, por certo tempo e em certas
áreas ainda haja quem se disponha a exercer profissão para a qual não está qualificado.
Deverá pagar por esse crime pena à altura do risco a que submeta direta ou
indiretamente seus clientes. Mas, não há razão para crer que seja menor o
número dos que praticam esse crime hoje, sob o atual sistema de credenciamento
medieval. Ao contrário, a hipocrisia que preside o credenciamento pelos pares entorpece
as consciências e estimula a fraude.
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