Na função de presidente do
Superior Tribunal de Justiça, o ministro Joaquim Barbosa, ao condenar um juiz
acusado de favorecer certos advogados em alguns processos, verberou as
"decisões graciosas, condescendentes, fora das regras, de muitos juízes,
em conluios com advogados".
Parece-me um pronunciamento
natural e oportuno. Mas, como ocorre cada vez que uma autoridade condena a
corrupção na Justiça no Brasil, a reação foi imediata. Argumenta-se, nesses
momentos, imediatamente, que os casos registrados são exceções e que o acusador
produz generalizações indevidas movido apenas pelo desejo de aparecer na
Imprensa. É uma resposta inteligente, embora não me convença.
Desta vez, entretanto, a manifestação
do ministro suscitou, de profissionais da Justiça, respostas mais reveladoras.
Deslocaram essas respostas a discussão do tema das decisões viciadas pela
aproximação entre juízes e advogados para o das relações de amizade entre
pessoas em distintas posições de poder. E aí não se limitaram a realçar a
legitimidade das relações fraternas entre juízes e advogados, que ninguém pode
inferir das declarações de Joaquim Barbosa que não deveriam existir.
Ao contrário, investiram
representantes dos juízes federais e dos advogados do Brasil contra o direito
da pessoa humana de ter amigos em qualquer lugar. Segundo o publicado nOGlobo,
o presidente da Associação dos Juízes Federais manifestou-se nestes termos: “A
Imprensa divulgou que o ministro tem uma namorada advogada. Como é que fica
isso?” Relata a mesma fonte pronunciamento na mesma direção, agora do
presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, de que até amantes precisam ser
punidas em casos de relações promíscuas entre juízes e advogados.
Pretendem com isso dizer que não
há diferença entre o acusador e os acusados. Só que relações de amizade ou amor
entre pessoas das duas classes não constituem promiscuidade! O que não
pode haver são decisões injustas motivadas pelo desejo de agradar os mais próximos.
E principalmente pelo interesse financeiro, quando, como nos casos
frequentemente divulgados pela imprensa, os advogados amigos são, na verdade,
portadores de suborno pago aos juízes.
Não se pode impedir que marido e
mulher se encontrem nas posições de juiz e advogado, professora e aluno, fiscal
e empresário. O absurdo é confundir a existência dessas relações com as de
favorecimento iníquo. Isto põe em destaque o princípio que rege a ocupação das
funções públicas em nosso país, de que a amizade é que deve prevalecer e não a
inteligência, o coração e não a cabeça, o interesse e não a justiça...
Para as nossas elites, o juiz não
pode ter namorada advogada porque, nesse caso, terá de se deixar influenciar
por ela nas suas decisões. Quando o chefe de um poder da República defende o
princípio contrário, dizem que apenas quer aparecer. Não
admitem os poderosos no nosso país que quem quer que seja manifeste a aspiração
de que as decisões das autoridades se orientem, não pelos seus afetos e interesses,
mas pelo que é certo e o que é errado.
Para combater essa cultura, os
instrumentos de proteção automática contra o favorecimento ainda precisam ser
muito aperfeiçoados. É preciso esforço par ampliar o âmbito das seleções por
concursos público. O sistema de distribuição aleatória para o julgamento de
ações na Justiça deve ser estendido. E, tanto quanto possível, a aproximação
entre juiz e advogados ao longo deve processo deve ser limitada às audiências
públicas. Não há que buscar ver em tal limitação ofensa a ninguém, mas, sim,
proteção para todos.
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