sábado, 5 de setembro de 2015

Política Científica Tropical

Uma intervenção desejável do Governo na economia é o apoio ao desenvolvimento da pesquisa científica. Entretanto, neste aspecto também, a atuação do governo brasileiro, ao longo das últimas décadas, conseguiu substituir o serviço do interesse público pelo da oligarquia.
Os dois instrumentos básicos da política científica, a concessão de bolsas de estudos e o apoio a projetos de pesquisa se transformaram gradativamente em mecanismos de simples desvio de renda. Para isso, se utilizou a veneranda estratégia de fantasiar de critérios de mérito critérios de simples reconhecimento de valores estabelecidos.
As bolsas de estudos deixaram de ser dirigidas aos jovens que demonstrem, pelo seu desempenho acadêmico, maior potencial de pesquisa, e passaram a ser  dirigidas aos programas de pós-graduação mais bem avaliados. Por seu turno, os programas de pós-graduação, assim como os pesquisadores e quaisquer outros proponentes de projetos de pesquisa, são avaliados, não pela qualidade, mas, cada vez mais exclusivamente, por dois indicadores: a quantidade de artigos publicados em periódicos de renome internacional e a quantidade de títulos de doutor concedidos.
Este segundo atributo dispensa maior análise. O poder de conceder títulos e a qualificação para recebê-los são clássicos instrumentos de preservação artificial das elites.
O outro é ainda mais perverso. Impõe uma atitude de colonizado e induz uma aproximação com grupos de pesquisa estrangeiros que não contribuem para o desenvolvimento da autonomia na pesquisa.
Não há dúvida de que os países emergentes têm de se voltar para o exterior se quiserem fortalecer sua capacidade de pesquisa. Para isso, usávamos dois mecanismos eficientes: o envio dos melhores estudantes para as melhores universidades estrangeiras e a atração de pesquisadores estrangeiros capazes de alavancar pesquisas nas nossas universidades. Com a exigência de publicar no exterior, não nos fortalecemos em nada. Em vez de buscarmos a excelência, o caminho fácil apontado por este indicador é a aproximação no exterior com linhas de pesquisa secundárias e com grupos de pesquisa cuja mentalidade etnocêntrica se compraz em satisfazer a necessidade de publicar dos que se submetam à sua liderança.
Ressalvo que esta ainda não é a regra geral. Eu mesmo, durante muitos anos desfrutei de bolsas de produtividade em pesquisa. Simplesmente porque os frutos menos importantes da minha atuação na Universidade me qualificavam para ter meus projetos aprovados e a comprovação dessa qualificação favorecia as instituições em que trabalhei. Isto foi um erro, na minúscula medida em que serviu de respaldo a um sistema errado. Erro que pretendo nunca mais repetir.