segunda-feira, 20 de julho de 2015

Os Políticos e a Atração do Mal

A Síndrome de Estocolmo é um fenômeno psicológico em que a vítima de sequestro acaba por apaixonar-se pelo seu algoz. È uma manifestação de um fenômeno mais amplo, em que o frágil ser humano rende-se e passa à idolatria do Mal que deveria enfrentar. Acredito que isto aconteceu no Brasil com alguns participantes do Mensalão e do Petrolão.

A polícia sucumbe à tentação de praticar os crimes que deveria inibir. Como esperar que os políticos encarregados de impor uma Constituição Solidária aos poderosos de uma colônia povoada por degradados não abuse do poder? A Lei do Mais Forte está sempre ocupando os terrenos baldios na alma humana.

A ciência política já estudou a mudança de perfil dos partidos, no processo pelo qual as correntes políticas evoluem no espectro de questões sociais e políticas que dominam o imaginário coletivo. Quando novos temas ganham destaque, os partidos que têm líderes carismáticos deslocam-se em reposta ao apoio econômico de lobbies com posições conservadoras em relação às novas questões. Essas posições se consolidam enquanto o debate personalista as escamoteia. Aos partidos que carreiam menos votos pelas virtudes percebidas nos seus líderes que pelas suas posições de princípio cabe apoiar as novas teses que contam com menor apoio dos mais poderosos no momento e perder as eleições.

Isto torna preferíveis os sistemas eleitorais que pedem a escolha entre ideias e não entre pessoas. O voto em lista, a proibição de coligações, o regime parlamentarista têm esta vantagem, de diminuir a importância das qualidades pessoais dos políticos nas eleições. Outra vantagem decorre de que os eleitores tendem a buscar nas pessoas as virtudes erradas. Para um líder nacional, as virtudes realmente importantes são as teologais. Mas, a cultura dominante valoriza, em vez da fé, a capacidade de convencer, em vez da esperança, a disposição para dar vazão à ira, em vez da caridade, a inclinação por satisfazer predileções de grupos particulares.

Um parlamentarismo com mandatos não renováveis diminuiria o atrativo de corromper os governantes, pois estes, além de ter poder por pouco tempo, estariam sujeitos a serem substituídos a qualquer momento. Além disso, reduzir o número de cargos de livre nomeação e limpar o cipoal de regulação que turva os controles contribuiria para a transparência da gestão e a detecção dos favorecimentos. 

Enquanto isto não ocorre, louvemos as leis anticorrupção que já começaram a incomodar os facínoras. Mas, não poderemos nunca prescindir da cooperação internacional para aplicar os critérios de detecção do enriquecimento injustificado. E, no mundo em que vivemos, a exacerbação dos conflitos militares estimula o tráfico de influência e a proteção aos corruptos aliados. Apoiemos novamente os governantes corrompidos de hoje quando voltarem à Oposição, se tornarem a desempenhar o velho papel de denunciantes que os levou ao poder.

segunda-feira, 13 de julho de 2015

Um Discurso do Papa Francisco


Comecemos por reconhecer que precisamos duma mudança. Quero esclarecer, para que não haja mal-entendidos, que falo dos problemas comuns de todos os latino-americanos e, em geral, de toda a humanidade. (...)

Queremos uma mudança, uma mudança real, uma mudança de estruturas. Este sistema é insuportável: não o suportam os camponeses, não o suportam os trabalhadores, não o suportam as comunidades, não o suportam os povos.... E nem sequer o suporta a Terra, a irmã Mãe Terra, como dizia São Francisco. (...) uma mudança que toque também o mundo inteiro, porque hoje a interdependência global requer respostas globais para os problemas locais. A globalização da esperança, que nasce dos povos e cresce entre os pobres, deve substituir esta globalização da exclusão e da indiferença. (...)

Sofremos de certo excesso de diagnóstico, que às vezes nos leva a um pessimismo charlatão ou a rejubilar com o negativo. Ao ver a crônica negra de cada dia, pensamos que não haja nada que se possa fazer além de cuidar de nós mesmos e do pequeno círculo da família e dos amigos (...)

Vós, os mais humildes, os explorados, os pobres e excluídos, podeis e fazeis muito. Atrevo-me a dizer que o futuro da humanidade está, em grande medida, nas vossas mãos, na vossa capacidade de vos organizar e promover alternativas criativas na busca diária dos “3 T” (trabalho, teto, terra), e também na vossa participação como protagonistas nos grandes processos de mudança nacionais, regionais e mundiais (...)

Sabemos, amargamente, que uma mudança de estruturas, que não seja acompanhada por uma conversão sincera das atitudes e do coração, acaba a longo ou curto prazo por burocratizar-se, corromper-se e sucumbir. Por isso gosto tanto da imagem do processo, onde a paixão por semear, por regar serenamente o que outros verão florescer, substitui a ansiedade de ocupar todos os espaços de poder disponíveis e de ver resultados imediatos. (...)

Porque «vimos e ouvimos», não a fria estatística, mas as feridas da humanidade dolorida, as nossas feridas, a nossa carne. Isto é muito diferente da teorização abstrata ou da indignação elegante. Isto comove-nos, move-nos e procuramos o outro para nos movermos juntos. Esta emoção feita ação comunitária é incompreensível apenas com a razão: tem um plus de sentido que só os povos entendem e que confere a sua mística particular aos verdadeiros movimentos populares (...)

Conheci de perto várias experiências, onde os trabalhadores, unidos em cooperativas e outras formas de organização comunitária, conseguiram criar trabalho onde só havia sobras da economia idólatra. As empresas recuperadas, as feiras francas e as cooperativas de catadores de papelão são exemplos desta economia popular que surge da exclusão e que pouco a pouco, com esforço e paciência, adota formas solidárias que a dignificam (...)

Sob o nobre disfarce da luta contra a corrupção, o narcotráfico ou o terrorismo – graves males dos nossos tempos que requerem uma ação internacional coordenada – vemos que se impõem aos Estados medidas que pouco têm a ver com a resolução de tais problemáticas e muitas vezes tornam as coisas piores (...)

A concentração monopolista dos meios de comunicação social que pretende impor padrões alienantes de consumo e certa uniformidade cultural é outra das formas que adota o novo colonialismo. É o colonialismo ideológico (...)

Até o crime e a violência se globalizaram. Por isso, nenhum governo pode atuar à margem duma responsabilidade comum. Se queremos realmente uma mudança positiva, temos de assumir humildemente a nossa interdependência (...)

Hoje vemos, com horror, como no Oriente Médio e noutros lugares do mundo se persegue, tortura, assassina a muitos irmãos nossos pela sua fé em Jesus. Isto também devemos denunciá-lo: dentro desta terceira guerra mundial em parcelas que vivemos, há uma espécie de genocídio em curso que deve cessar (...)


Isto disse Francisco, dia 9 último, em Santa Cruz de La Sierra. Leiam o texto integral em http://pt.radiovaticana.va/news/2015/07/10/discurso_do_papa_aos_movimentos_populares_(texto_integral)/1157336

terça-feira, 7 de julho de 2015

A Tragédia Grega

O governo de esquerda na Grécia convocou um plebiscito para decidir sobre a proposta de negociação dos credores da sua dívida externa. No plebiscito, os eleitores apoiaram a posição do governo, mas a simples convocação do plebiscito acentuou o agravamento da crise econômica do país.
Direita, Esquerda e Centrão são conceitos moldados desde a Revolução Francesa para caracterizar as forças políticas. A Direita ouve as elites, o grande empresariado, a grande Imprensa, o aparelho do Estado e conduz a massa, impondo sua liderança pela força ou pelo engano. A Esquerda procura ouvir o Povo, decifrar seus interesse legítimos  e atingir os objetivos que emergem da consciência que ele atinja dos seus próprios interesses. Enquanto essa consciência não se forma, quem acaba decidindo é o Centrão, formado por políticos mais próximos da massa, uns representando ora o perfil conservador da classe média, outros empolgados por uma ou outra bandeira mais progressista, mas, todos caracterizando-se pela dificuldade de alcançar a dimensão mais profunda dos problemas políticos.
O confronto entre Direita e Esquerda, decidido na Democracia pelo Centrão, é, na visão Marxista, um aspecto de um conflito mais fundamental entre Capital e Trabalho, entre as lideranças econômicas e os empregados. Mas, a visão estritamente política desse confronto é válida por si mesmo.  A questão é se é melhor para o progresso do país que seja este conduzido pelas lideranças da direita que não ouvem ou apenas fingem ouvir a massa ou pelas da esquerda que esperam a conscientização da massa para avançar.
O problema da opção pela direita é que as elites acabam por substituir o interesse nacional pelo seu próprio interesse. O problema da esquerda é que seus líderes legítimos têm de avançar muito devagar.
Outro vício, entretanto, aflige a esquerda. É o esquerdismo. Um desvio de direita pelo qual os líderes da esquerda trocam o objetivo de obedecer à vontade do povo pelo de fortalecer a sua liderança. No jargão militar, subordinam seus objetivos estratégicos ao objetivo tático do momento.  Foi isto que ocorreu na Grécia. O partido de esquerda convocou um plebiscito para fortalecer-se, enfraquecendo seu povo.
Os aspectos técnicos da negociação da dívida grega deveriam ter sido deixados há muito a critério de especialistas. A Democracia precisa de barreiras que protejam as decisões econômicas da influência do conflito pelo poder entre as facções políticas. No Brasil, vivemos uma situação semelhante. Erros do passado levaram à urgência de um ajuste fiscal. A administração do ajuste precisa de rapidez e eficiência que são prejudicadas pela interferência da política.
A crise grega ensina que nem Direita nem Esquerda são opções realmente progressistas. O debate político e a alternância do poder por eleições democráticas protegem-nos do arbítrio - e isto é da máxima importância – mas, não nos protegem da incompetência. Os governos de esquerda, tanto quanto os de direita, são sujeitos a corrupção e seus líderes erram tanto quanto os do Centrão.
O Povo deve ter o poder de mudar os governantes e os legisladores. Mas, assim como as decisões técnicas do dia a dia da aplicação das leis são entregues a juízes controlados por corregedores e tribunais superiores, as decisões quanto à execução das políticas de governo deve caber a especialistas.

As grandes propostas do governo eleito deveriam ser consubstanciadas em projetos e a decisão quanto a viabilizar esses projetos deveria ser objeto de julgamento de comissões de especialistas. Agências de proteção do meio ambiente, do patrimônio cultural, das minorias étnicas, etc., deveriam especializar-se em avaliar tais projetos conjuntamente com representantes dos ministérios. Concluída a seleção dos projetos prioritários, sua execução até o final deveria ser obrigação de todos os futuros governos e objeto de fiscalização tão somente dos tribunais de contas quanto à legalidade dos atos praticados pelos executores e sua fidelidade aos objetivos aprovados.